28 jul

Certidão – Marina Porteclis

Certifico, para os devidos fins, que estou de saco cheio

Que meu saco simbolizado não cabe mais um grão de centeio

Que os pães feitos dos centeios passados têm sido pouco para tolerar a fome que sinto de tolerância

Que o pão nosso de cada dia não alimenta mais a mais esquálida das crianças

E que existem milhares de criança com fome dentro e fora de mim

Certifico que o mundo morrerá de inanição

A vida tem emagrecido e a Saúde definha doente

As estradas que ainda restam não levam a lugar algum

As pessoas não sabem ler as placas, a maioria analfabeta

E as que não o são, não sabem aonde querem chegar,

Mesmo alfabetizadas, são indecisas e cegas

Certifico que a hipocrisia desintegra a solidez de qualquer instituição:

Igreja, Congresso, Superiores Tribunais, Tribunais Celestes, empresas públicas e empresas latrinas, digo, privadas…senzalas, senzalas, senzalas

A ignorância acorrenta

O preconceito chicoteia

O tronco é a multidão de humanos que julgam outros humanos

Que compram outros humanos…

Humanos?

Humanos?

Humanos de segunda categoria, que prendem, espancam, matam a vida alheia e dos humanos de primeira

Certifico que ninguém poderá ser digno sem antes assinar embaixo do que escreve

E pagar o preço do que leva

O que é isto, senhores Humanos?

Abram os livros e desliguem as novelas!

Não existem mais esconderijos para tanta podridão!

Empenhem as almas, mas paguem o que devem

Apareçam antes de apontar o dedo em nossa direção

E quem nunca se sentiu apontado que estenda o primeiro dedo:

O do meio?

É apenas uma idéia

Certifico que, apesar do tom raivoso, gostaria que esta certidão tivesse tom de prece

Certifico, já em silêncio, de olhos fechados, com as mãos unidas e paralelas, que de nada servirá esta certidão sem a mínima reflexão

É tudo o que me cumpre certificar, sem cautelas.

 

 

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